domingo, 4 de dezembro de 2011

RELACIONAMENTOS



Para começar, uma afirmação de Nietzsche com a qual concordo
inteiramente.

Dizia ele: “Ao pensar sobre a possibilidade do casamento, cada um
deveria se fazer a seguinte pergunta: Você crê que seria, capaz de
conversar com prazer com esta pessoa até sua velhice”?

Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que
desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar.


eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer.

Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se
fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes
inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o
tempo todo: ”Eu te amo...”


Barthes advertia: “Passada a primeira confissão, “eu te amo” não
quer dizer mais nada. É na conversa que o nosso verdadeiro
corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua
nudez poética”.

Recordo a sabedoria de Adélia Prado: “Erótica é a alma”.


O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a
sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a
bola.
Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que
tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente
para aí que ele vai dirigir sua “cortada”, palavra muito sugestiva, que
indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar.


O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento
em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi
colocado fora de jogo.

Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.


O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas
raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que
nenhum dos dois perca.

Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e
faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar
certo, para que o outro possa pegá-la.


Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui, ou
os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o
outro erra, pois o que se deseja é que ninguém erre. E o que errou
pede desculpas, e o que provocou o erro se sente culpado. Mas não
tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que
ninguém marca pontos...


A bola: são nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de
palavras.

Conversar é ficar batendo sonho prá lá, sonho prá cá...


Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis.
Ficam à espera do momento certo para a cortada.

Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo,
arrebentá-lo, como bolha de sabão...

O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento.

Aqui, quem ganha sempre perde.


Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que
deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada,
do coração.

O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas
de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem - cresce o amor...

Ninguém ganha para que os dois ganhem. E se deseja então que o
outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim...


RUBEM ALVES é educador, escritor, psicanalista
e professor emérito da Unicamp.

Recebi por e-mail de LC-RJ










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